quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Ser ou não ser, eis a questão

A cena: sábado, cinco horas da tarde. Estávamos eu e uma amiga na porta da universidade, após uma aula chatíssima de pós graduação, que havia começado às sete da manhã. Ela me fazia companhia enquanto eu aguardava meu marido vir buscar-me, já que é inviável encontrar uma vaga próxima à faculdade, sobretudo quando se sai de casa atrasada, o que era o meu caso. Visto que ela ia casar daí a alguns meses, me perguntava como eu dava conta de estudar, trabalhar e cuidar da casa ao mesmo tempo, se é que tem explicação para isso.

Pois bem, durante a conversa sobre a tal fórmula mágica não nos demos conta de que uma mulher nos observava. Eu explicava que o fato de ter um marido parceiro, que divide as tarefas ajuda, embora, a carga em cima da mulher ainda seja bem maior, o que, no meu caso, custa boas sessões de terapia para falar do assunto. A minha amiga então me inquiriu: - E quem cozinha na sua casa? Falei que almoçávamos fora todos os dias, mas que quando recebemos alguém, é ele quem assume as panelas, já que na cozinha, só sei ferver água e no microondas! Em seguida, ela me perguntou: - E quem lava as roupas? A máquina, respondi de pronto. Finalmente ela me questionou: - E as roupas, quem passa? Ora, eu passo as minhas e ele as deles, falei.

Nesse momento a mulher que mencionei acima, com a propriedade de quem estava extremamente atenta ao que dizíamos, interrompeu e disse: - E afinal, vocês dormem juntos? Fiquei tão indignada, não só com a intromissão dela, ouvindo e palpitando no assunto alheio, mas, e sobretudo, com o fato de, em pleno século XXI, convivermos com mulheres que acreditam que o real valor feminino se resume aos afazeres domésticos. Ora, em qual cartilha está escrito que cuidar da casa e da família é responsabilidade apenas da mulher?

Estudamos, trabalhamos, vamos ao salão e à academia, educamos os filhos, dedicamos tempo aos nossos pais e demais familiares, damos conselhos para as amigas, sabemos de cor a data de aniversário de todos os parentes e colegas de trabalho (e compramos lembrancinhas para todos, o que é pior!) e ainda somos julgadas pelo fato de que, em alguns momentos da rotina doméstica, propomos a divisão das tarefas? E o pior de tudo é que, em muitos dos casos, são as próprias mulheres que nos julgam, a ponto de achar que somos menos mulheres por causa disso. Como se para ser mulher temos que passar o dia varrendo casa, lavando cuecas e engomando as camisas do marido.

Não tenho a menor pretensão de ser feminista e levantar bandeiras, até mesmo porque respeito muito as mulheres que cuidam da casa com esmero e abnegação, mas acredito que o real mérito das pessoas, independente do gênero, está na realização de cada um de nós e a minha, sinceramente, está no fato de constituir uma família e cuidar dela, mas, igualmente, construir uma carreira sólida, trabalhando com ética e responsabilidade.

Mas, voltando a cena inicial, respondi (furiosa, diga-se de passagem) a nova interlocutora da seguinte forma: - É claro que dormimos na mesma cama, até mesmo porque meu marido não casou-se com a empregada! Neste momento, para arrematar a “comédia da vida privada”, eis que surge o meu marido e diz que só estava me esperando para irmos encontrar dois casais de amigos em um restaurante muito bacana, pois, afinal, não era justo eu passar o dia estudando e ele ficar se divertindo. Lasquei-lhe um beijo e quase sugeri que ela aproveitasse o fato de estar na faculdade para ter umas aulinhas de modernidade com o meu marido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário